"Ser jornalista é separar o joio do trigo...
... E publicar o joio" - Mark Twain
O que parece acontecer, nos cursos de jornalismo no Brasil, é uma preocupação exacerbada com o respeito ao formato da maioria das notícias que estão na mídia. Ainda que a pirâmide invertida – muito mais comercialmente que ideologicamente – faça sentido, parece haver uma necessidade de garantir que, daquela maneira, os alunos, ao final dos quatro anos, saberão escrever, e, por isso, poderão ser absorvidos pelo mercado.
Na realidade, é frustrante ver como as matérias de maior destaque na história, muitas das ganhadoras de prêmios importantes, não estão escritas dessa forma: ao contrário, ganham pontos por serem mais pessoais, mais subjetivas, mais, portanto, opinativas. Quem decide fazer jornalismo entra na universidade sem sequer imaginar o que acontecerá com a maneira como costuma escrever.
Eu me lembro bem de, antes do meu vestibular para jornalismo, ter lido em uma compilação de reportagens, a matéria de Merriman Smith sobre a morte do presidente Kennedy (ganhadora do Pulitzer de 1964) e pensado: “Seria genial poder contar histórias, no papel, todos os dias, pelo resto da minha vida”. No entanto, quando começamos o curso, somos adestrados a escrever de uma maneira diferente e, hoje, eu jamais seria capaz de escrever algo tão íntimo quanto era aquela matéria que me fez querer ser jornalista.
Nossas idéias já afloram na tal pirâmide invertida (até para contar uma história qualquer, lembro-me sempre que o fundamental é estabelecer “o que, quando, onde, quem, como e por quê” nos primeiros segundos). Além disso, o jornalismo opinativo, nas raras vezes quando é colocado em pauta em sala de aula, é deixado para os experts. Pensemos: nenhum aluno de jornalismo ousa querer escrever colunas; quem escreve coluna é quem pode fazê-lo, ou seja, quem já está na área há décadas e adquiriu o know how e o status para poder dar sua própria opinião (algo absurdo se visto de uma perspectiva mais estreita, afinal, opinião é o mínimo que possuímos, enquanto seres pensantes).
O que acontece, no entanto, é que, se isso um dia foi verdade (talvez no tempo de universidade de alguns de nossos professores...), hoje, já não é mais. O jornalismo está em um processo de mudança que trará, cada vez mais, a participação da voz do próprio jornalista para uma matéria. Notícia por notícia, podemos ler uma a cada segundo, na internet, contando só os fatos principais; mas seguimos comprando jornais, para saber mais, e comprando revistas, para ir mais fundo nos assuntos que nos interessam.
Com a expansão dos blogs e microblogs, contam, agora, outros elementos além da função de informar, ou o currículo, para que sua opinião valha a pena ser lida. Contam o grau de inovação, de perspicácia, de coragem, entre outros critérios igualmente subjetivos. O curso de jornalismo não está formando profissionais para o mercado atual: está formando jornalistas da velho escola, que, ao entrar no mercado, este de agora, são forçados a iniciar uma nova busca de qualificação, de identidade, de perfil.
Dentro de não muito tempo, se seguirmos assim, o que o curso estará fazendo será desqualificando seus alunos para a profissão de jornalista, enquanto tenta que se atenham a um modelo que já não é nem único (nunca foi, na realidade) nem predominante nos veículos.
Eu, algum dia, sonhei ganhar um Pulitzer (porque sonhar é permitido) com uma reportagem como a de Merriman Smith. Hoje, acho mais fácil sonhar com conseguir voltar no tempo e escolher outro curso, para, então, voltar a sonhar com o Pulitzer. A habilidade que um dia eu achei que tinha, com lápis, papel e idéias, hoje, cedeu lugar para o pseudo-conhecimento jornalístico. Hoje, eu não me sinto nada habilidosa, sinto-me demasiadamente jornalista. E, nos últimos quatro anos, esses termos se tornaram antônimos.
Sem comentários:
Enviar um comentário